terça-feira, maio 30

O que nos faz bons ou maus

 

A discussão sobre como os comportamentos relacionados à moralidade aparecem nos seres humanos é antiga. Muitos filósofos do século XVII, especialmente John Locke, adotavam a ideia de seres humanos como “tabulas rasas”, ou seja, a concepção de que as pessoas nasciam sem qualquer conhecimento ou tendência comportamental, e que as suas experiências com outras pessoas e com o restante do mundo seriam os aspectos que determinariam como os indivíduos iriam agir. Nessa visão, os seres humanos seriam papéis em branco prontos para serem escritos pelo meio social. Em épocas posteriores, em especial nos séculos XIX e XX, ganhou força entre alguns estudiosos do comportamento humano a ideia de que a maior parte de nossa conduta é inata, predeterminada biologicamente, e assim o ambiente teria pouca ou nenhuma influência sobre como nos comportamos.
        Estudos recentes sugerem que não somos geneticamente bons ou maus, e tampouco somos folhas em branco à espera de preenchimento. O psicólogo canadense Paul Bloom, em O que nos faz bons ou maus (Editora BestSeller, 2014, R$ 30,00) sugere que nós já temos um senso moral quando bebês, mas isso não significa dizer que temos um impulso inato para fazer coisas boas ou ruins. O senso moral ao qual o autor se refere é uma capacidade de fazer apreciações morais, de entender quando alguém agiu bem ou mal em determinada situação. Por exemplo, existem estudos que indicam que bebês de menos de um ano de idade preferem interagir com pessoas que se comportaram “bem” (pessoas que não estragaram uma brincadeira, ou que não roubaram objetos de outras – tudo isso parte de experimentos conduzidos por psicólogos, e observados pelos bebês) a aquelas que tiveram um comportamento que se pode considerar inadequado (receber uma bola em uma brincadeira e, ao invés de devolvê-la a quem a jogou, fugir com ela, por exemplo).

        O senso moral que temos quando somos bebês, afirma Bloom, vai sendo refinado ao longo de nossas vidas. A “moralidade aprimorada” é uma característica dos seres humanos, que podem pensar a respeito das mais diversas questões morais e, racionalmente, encontrar o curso de ação mais sensato quando confrontados com uma dessas questões. Por exemplo, Bloom afirma que muitas pessoas – inclusive crianças – que decidiram se tornar vegetarianas assim o fizeram porque entenderam que existiam boas razões morais para isso (como o sofrimento dos animais durante o processo de criação e abate). Assim, a ideia de que a razão é “escrava das paixões” não é sempre verdadeira.
Creio que a mensagem mais importante do livro de Bloom é a de que podemos usar nossa capacidade mental para reconsiderar a maneira com que nos relacionamos com outras pessoas e animais para, assim, agir e pensar melhor. Há pouco mais de um século, muitas sociedades toleravam pessoas brancas “possuírem” escravos negros; homens e mulheres eram queimados em fogueiras por serem considerados feiticeiros; pessoas eram punidas com a extirpação de partes do corpo, ou com a morte, por causa de adultério. Evoluímos culturalmente porque pensamos melhor a respeito dessas e de outras questões, e mudamos nossas ações como consequência disso. E podemos também supor que teremos uma sociedade cada vez melhor se continuarmos tendo a razão como guia.

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