sábado, março 24

Cambalachos de toga

Crédito: Kleyton Amorim/UOL/Folhapress
APEQUENADO Manifestantes protestam contra privilégios jurídicos a Lula defronte a sede do STF em Brasília (Crédito: Kleyton Amorim/UOL/Folhapress)

Com uma precisão jurídica jamais vista na história, o STF cria a liminar-Lula, um dispositivo casuístico destinado a livrar o petista da prisão, envergonha os brasileiros, ao promover bate-bocas insultuosos, e transforma o plenário da corte na maior distância entre o cometimento do crime e o cumprimento da Justiça.

Há um exatamente um século, muito antes de Lula medir publicamente o real tamanho moral da Suprema Corte do País, ou seja, minúscula, “totalmente acovardada”, Monteiro Lobato jogava luz sobre a nova Justiça que emergia no regime republicano, àquela altura ainda em processo de maturação. “Tinha vontade. Tem medo. Tinha Justiça. Agora, tem cambalachos de toga”, escreveu num primor de artigo. Pois o deplorável destino se cumpriu na noite de quinta-feira 22. Como se de joelhos estivesse diante de quem um dia a enxergou totalmente despida, a Suprema Corte promoveu um cambalacho jurídico e, com uma precisão cirúrgica jamais vista na história do tribunal, ajustou a lei para salvar Lula.
A Páscoa nunca será tão doce para um condenado à cadeia por corrupção. Ao adiar a discussão do mérito do pedido de habeas corpus do petista para o dia 4 de abril e, na sequência, conceder uma liminar pelo placar de seis a cinco para impedir o cumprimento da ordem de prisão pelo TRF-4, a corte dobrou a espinha para a defesa do petista. Se, na próxima sessão, o STF consagrar de vez a impunidade, durante a votação do mérito do HC, não haverá mais como descer na escala da desmoralização institucional. De qualquer forma, pelo que se viu na última semana, o plenário do Supremo representa hoje a maior distância entre o cometimento do crime e o cumprimento da Justiça. Pergunta-se: e os milhares de condenados presos, no País, à espera de um HC? Também terão liminar para aguardar nos recessos de seus respectivos lares a ordem de prisão? Definitivamente, o que aconteceu na noite dos horrores do Supremo não foi o sacrossanto respeito ao Estado de Direito, mas a rendição a um Estado de Arbítrio.

Difícil acreditar que o teatro encenado no STF não estava combinado entre os ministros pró-Lula. A demora dos ministros em discutir o cabimento do HC e em voltar do intervalo, inicialmente previsto para “10 minutos”, mas que durou meio tempo de uma partida de futebol, somada à viagem inadiável de Marco Aurélio Mello, logo ele que guerreou tanto nos bastidores e exerceu marcação cerrada sobre a presidente Cármen Lúcia para que aquela sessão acontecesse, compôs o espetáculo farsesco. A pantomima foi armada no convescote da vergonha. Ao fim, restou cristalino que o STF escancarou o que antes eram apenas brechas jurídicas para evitar a prisão de Lula. O tribunal manipulou a Carta Magna como quis. Como disse o ministro Luís Roberto Barroso, na sabatina de ministro do Supremo em 2013, na Constituição cabe tudo, quando prevalece o obscurantismo, as conveniências de ocasião, os chamados embargos auriculares, a relação promíscua com os políticos e a jurisprudência de carta-marcada. “Só não traz a pessoa amada em três dias”, dizia Barroso. Olha que, dependendo do freguês, até trás. Ao menos esse foi o recado mais eloqüente transmitido pelos ministros na sessão da quinta-feira 22.
Se algum consenso havia entre os partidários do ex-presidente Lula e aqueles contrários a ele era grave e urgente. A urgência, inclusive, era o argumento principal do habeas corpus impetrado pela defesa de Lula, comandada pelo ex-ministro do Supremo Sepúlveda Pertence. Ainda que aguardem julgamento no STF, além do de Lula, outros 54 pedidos de habeas corpus. Em algumas horas, porém, como se fossem vampiros ao contrário, temerosos da ausência de luz, tão logo o sol de pôs alterou-se nos 11 ministros do Supremo todo sentido de urgência. O que antes era motivo de pressão sobre a presidente do STF, Cármen Lúcia, e de bate-bocas constrangedores de ministros como Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso tornou-se adiável e compromissos triviais e quase pueris se tornaram prioridade.

JOGO COMBINADO Marco Aurélio fala com advogados de Lula sobre a condução da sessão do STF, que acabou livrando o petista da cadeia até o próximo dia 4

“Peço que a sessão seja suspensa.Vou ter que me ausentar porque tenho voo para o Rio às 19h40” Marco Aurélio Mello, mostrando passagem da viagem ao Rio
O STF levou três horas e meia julgando uma questão preliminar: se deveria ou não considerar o habeas corpus pedido pela defesa de Lula. Concluída essa preliminar, às 18h30, o ministro Marco Aurélio Mello disse que tinha um voo marcado para o Rio de Janeiro às 19h40. Considerava mais importante abandonar o julgamento que definia se Lula, condenado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) a 12 anos de prisão, poderia ou não ir para a cadeia, para participar da posse da nova diretoria da Academia Brasileira de Direito do Trabalho. Certamente uma mensagem para os integrantes da academia explicando a importância do momento e desculpando-se pela ausência teria sido bem compreendida por todos. Mas, para Marco Aurélio, o compromisso era inadiável. De qualquer forma, terminada a posse da Academia, Marco Aurélio poderia pegar na sexta-feira 23 um voo de volta para Brasília e o STF poderia retomar o julgamento. Mas o STF, ao contrário da maioria do povo brasileiro, não trabalha às sextas-feiras. Pena que o abismo entre a sociedade e a mais alta corte do País é mais profundo que a folga do último dia da semana.
      Luis Roberto Barroso:    Gilmar Mendes:                                            
“É preciso que a gente anteveja esse tipo de manobra. Porque não se pode fazer isso com o Supremo. Ah, agora eu vou dar uma de esperto e vou conseguir a decisão do aborto. De preferência, na Turma com dois, três ministros. Aí a gente faz 2 a 1”

Luis Roberto Barroso: 

“Você é uma pessoa horrível. Uma mistura do mal com o atraso e pitadas de psicopatia”
“Qual sua ideia? Nenhuma. É bílis, ódio, mau sentimento. É uma coisa horrível. Vossa excelência nos envergonha”
“É muito penoso para todos conviver com vossa excelência aqui”.
Gilmar Mendes: 

“Eu vou recomendar ao ministro Barroso que feche seu escritório. Feche seu escritório de advocacia!!”

FONTE - ISTO É








Nenhum comentário:

Postar um comentário