quinta-feira, dezembro 24

RETROSPECTIVA POÉTICA

 Se Cristo Voltasse Agora

Autor - Crispiniano Neto

01 Se o filho do carpinteiro E da moça pobre, Maria, Voltasse à terra hoje em dia Qual seria o seu roteiro?... Em qual cocheira ou lixeiro Maria ia descansar? Qual Gaspar, qual Baltazar, Trariam mirra e incenso? São nessas coisas que penso Quando me encontro a rezar. 02 Para assassinar rebentos Qual o novo Herodes, rei? Contra os doutores da lei, Quais os novos argumentos? Qual ação, em quais momentos Da vida de qual nação? Qual seria a região Escolhida pra pregar? Quem Cristo iria chamar Pra ser apóstolo e irmão? 03 Quem seria o Satanás A pô-lo em cima do monte, Mostrando a ele, qual fonte Do poder e do cartaz? Qual Dimas, qual Barrabás? Qual seria a solução Pra multiplicar o pão? E em quais vendilhões do templo Cristo daria um exemplo Com seu chicote na mão? 04 Penso muito em quem seria A Maria Madalena? Qual Judas entrava em cena Pra lhe trair qualquer dia? Que Caifás lhe acusaria? Que Sinédrio o condenava? Que Pilatos se afastava Temendo a repercussão? E qual o centurião Que a Cristo crucificava?... 05 Buscando respostas, fico Olhando a sociedade Tão cheia de iniqüidade Entre o pobre e o rico; Meu juízo eu crucifico Procurando entender isto, Mas pra onde eu olho, avisto O cão brigando com Deus E os modernos fariseus Matando e vendendo Cristo... 06 Vendo que o barão só faz Tudo contra Cristo e os seus Penso que o mundo é de Deus, Mas quem manda é satanás Então eu olho pra trás Pelo livro da verdade, Vejo que a humanidade Tá repetindo o passado E o pobre é tão massacrado Quanto na antiguidade... 07 Zé Carpinteiro seria, Hoje qualquer operário Que com um magro salário Sustenta a magra Maria. Ela, sem anestesia, Não descansa em cama bela. E sem previdência, ela Pare debaixo da ponte, Num casebre ao pé do monte Ou num barraco em favela. 08 Gaspar, Belchior, Baltazar. Reis Magos de todas cores Representantes das dores Do anseio popular, Cristo os vai encontrar Nos sindicatos, em ação, Por entre a população, Nas pastorais, contra o velho Pregando o novo evangelho Que prega a libertação. 09 Herodes temos demais Mandando matar crianças Mas hoje não usam lanças Pra não revoltar os pais... As multinacionais Com DIU, pílula e ligação Matam a nova geração, Cortando pelas raízes Para que os ricos países Comam nossa produção! 10 Para os doutores da lei É fácil a contestação Que alguns têm bíblia na mão Porém pra quê eu não sei. Enquanto amigos do “rei” Juízes e senadores Forjam leis e jogam flores Em uma sociedade Que defende a liberdade De explorar trabalhadores... 11 Cristo vindo vai pregar Na África e América Latina Aonde sua doutrina Tem que se concretizar. Vem para desafiar O selvagem capitalista E a águia imperialista Que as nossas riquezas toma, Da mesma forma que Roma Fez com a pátria do Batista. 12 Para o seu apostolado Não chamaria doutores Nem ricos exploradores Que esse povo é desviado... Chamaria um maltrato Operário da construção; Uns metalúrgicos, que são De um grupo mais lutador, Um mineiro, um pescador E um camponês do sertão. 13 Satanás é o potentado Que vendo o seu bom início Lhe chama em sem edifício E lhe diz: - Tome cuidado, Se você ficar calado Tem emprego e posição, Inda dou mais um milhão Para esconder na Suíça, Mas nunca fale em justiça Nem pregue a libertação... 14 Pensando em Deus, eu contemplo O homem desde criança, A construção da esperança Que Deus fez pra ser seu templo. Aí vejo o mau exemplo Dos atuais fariseus Explorando os irmãos seus, Mas Cristo trará chicotes Pra estes falsos sacerdotes Que vendem o templo de Deus... 15 O Dimas e o Barrabás São os marginalizados Que findam desesperados Com as divisões sociais... Quanto aos pães, temos demais Não é pra multiplicar Pois é bastante somar Dos poucos que têm riqueza E dividir com a pobreza Que nunca mais vai faltar! 16 Madalenas hoje são As mulheres oprimidas Algumas prostituídas Por força da precisão. Neste mundo de machão Mulher só vale a metade, É usada com maldade Em cozinha, cama e mesa Que o instinto de dureza Cega o homem pra igualdade. 17 Uns governantes Pilatos Vivem com as mãos lavadas E as consciências pesadas Sujas iguais às dos ratos. Acabam com sindicatos, Sacodem policiais Contra os cristãos atuais Negando ao povo o conflito Com um discurso bonito Pelos rádios e jornais. 18 Já não tem centurião Já não se usa mais cruz. Hoje pra matar Jesus Tem tortura e esquadrão. Matam mesmo na prisão; Pra o povo ser enganado Jogam num morro afastado, Pra dizer que ele não presta, Bota a mão branca na testa E um ladrão de cada lado. 19 Se Cristo voltasse agora Pregando o reino de Deus Encontrava os fariseus Mais duros do que outrora... Pois hoje o lobo devora Com mais maldade o cordeiro. Portanto, se o justiceiro Voltar pregando o que pensa Só tem uma diferença... Eles matam mais ligeiro.

Mossoró, 08 de julho de 1980


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