Querido amigo Ariano:
Há poucos dias lhe escrevi, perguntando-lhe, inclusive como andava minha situação. Volto agora a fazê-lo, depois de ter sido informado pela imprensa, brasileira e chilena do resultado de meu processo e de ter recebido um telegrama amigo de Monte e Paulo Cavalcanti, confirmando a notícia.
Escrevo-lhe agora, meu velho amigo, para dizer -lhe de minha sincera gratidão pelo interesse que você teve, desde o primeiro momento por meu caso.
Nunca me esqueço de sua valentia de querer bem, quando, ao chegar ao aeroporto do Recife, vindo de Brasília, num momento em que tudo era penumbra, interrogação, desconfiança, medo, denuncia, fuga, negação, em que os "amigos", antes e depois que o galo cantasse - não importava - diziam "quem é? Não conheço. Jamais vi este homem!" Ou o que era pior: " Conheco este homem, sempre desconfiei de suas intenções malvadas", lá estava você, fraterno, risonho, confiante, ao lado de Monte, ambos abraçando-me, quando cumprimentar-me, simplesmente cumprimentar-me, era uma ameaça a quem o fizesse. Você, Monte e outros, muitos outros, foram o contrário de alguns. Entre estes, nunca me olvido também, sem rancor e sem ressentimento, do testemunho de um professor de universidade, que, ao dobrar uma esquina - a do cinema São Luiz - me divisou a uns dez metros de distância e fez então o mais difícil: andou de lado.
Você, pelo contrário, veio sempre de frente ao meu encontro, e nosso encontro. Encarcerado, você procurava Elza, enquanto os que andavam de lado perderam nosso endereço.
Nesta carta "Sencilla" nada mais lhe direi além do meu, do nosso muito obrigado.
Do amigo-sempre
Paulo Freire.
Face-b/CHICO TORQUATO
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