sexta-feira, junho 27

OS SOLAVANCOS DA VIDA


Há na existência uma cadência irregular, um compasso que oscila entre a plenitude e o abismo. A vida, em sua coreografia secreta, não dança suavemente pelos salões da previsibilidade. Ela tropeça, ela se curva, ela empurra. E nesses solavancos, nesses instantes em que o chão se desmancha sob os pés, revela-se a textura mais verdadeira do viver.

Os solavancos da vida não pedem licença, não seguem roteiro. São como ventos que desarrumam os cabelos da alma, ou como pedras que se insinuam no sapato das ilusões. E, no entanto, são eles que retiram o espírito de sua zona de conforto, esse cárcere disfarçado de segurança. São os tropeços que rasgam as máscaras que desnudam a falsa serenidade, que nos fazem olhar para dentro com a gravidade de quem viu a face do caos.

É fácil amar a calmaria, mas é no desconcerto que o ser se reescreve. Quando tudo estremece, quando a bússola gira sem norte, ali habita a chance de um despertar. Pois os solavancos não vêm apenas para punir, vêm para ensinar. Eles nos devolvem a impertinência, nos recordam que a estabilidade é uma margem delicadamente construída sobre a areia movediça do tempo.

Cada sacolejo é uma vírgula na prosa do destino, um convite para rever o caminho, para abandonar o que pesa, para encontrar um novo eixo. E, curiosamente, é após a queda que muitas vezes aprendemos a andar com mais leveza, não porque o chão se tornou mais firme, mas porque aprendemos a dançar com as incertezas.

Que não tomamos os solavancos da vida. Que saibamos escutá-los como quem escuta um velho mestre, um sábio rude, mas necessário. Pois são eles que, entre dores e desajustes, moldam a silhueta mais honesta de nossa humanidade.

OLIVER HARDEN

CHICO TORQUATO

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