terça-feira, maio 27

Eduardo Campos se apresenta como o pós-Lula

Josias de Souza

Eduardo Campos no Roda Viva - 4 vídeos

Recém-chegado à seara oposicionista, o presidenciável do PSB, Eduardo Campos, é capaz de fazer oposição a todo mundo, exceto a Lula. Na entrevista que concedeu na noite passada ao programa Roda Viva, foi possível perceber que há método por trás da condescendência. Campos se esforça para vestir o figurino do pós-Lula.
O candidato acomoda sobre os ombros de Dilma Rousseff todas as culpas. “A gestora não entregou a gestão”, disse. E “a durona não comandou o enfrentamento à corrupção.” Rendida às piores práticas, “ela se enrolou no novelo da velha política”. Na economia, converteu-se de “mãe do PAC” em “madrinha da inflação.”
Ao discorrer sobre o tucano Aécio Neves, Campos como que incorporou o discurso do medo sugerido pelo marqueteiro petista João Santana, autorizado por Lula e encampado por Dilma. “A origem política do Aécio é mais conservadora do que a minha”, disse. Ele “participou do ciclo de Fernando Henrique, eu participei do ciclo iniciado pelo presidente Lula”.
E daí? Bem, “a diferença é que eu reconheço os avanços que o presidente Fernando Henrque fez para o Brasil e não fico aqui só apontando os erros. O Aécio e os tucanos têm uma dificuldade enorme de reconhecer os acertos. E aí passa um medo enorme para as áreas do Brasil que viram a importância do presidente Lula. Por exemplo, no Nordeste.”
O que Eduardo Campos afirmou, com outras palavras, foi o seguinte: Dilma não teve competência para aprofundar os “avanços” obtidos sob Lula. Aécio encarna o risco de retrocesso. E ele, egresso do governo Lula, é a expectativa de retomada do êxito que Dilma conspurcou.
“A população sabe que eu e a Marina [Silva] jamais vamos mexer em conquistas sociais, pela nossa história de vida, pela nossa caminhada, também pela nossa participação nessas conquistas”, disse Campos a certa altura, como que a alertar o eleitorado: gente, cuidado com o Aécio.
Prosseguiu: “Acho natural que se discuta diferenças porque, numa campanha como essa, você não vai discutir quais são os pontos comuns. O eleitor quer saber exatamente o que separa, o que é diferente. E o diferente é que nós podemos unir o Brasil. E eles [PT e PSDB, Dilma e Aécio] vão continuar submetendo o Brasil à divisão que o Brasil não suporta mais.”
Os entrevistadores tentaram de tudo para arrancar de Eduardo Campos uma observação crítica sobre Lula. Mas o candidato não disse nada a respeito de tudo. Em dado momento, recordou-se que Pasadena e a crise da Petrobras —moral e financeira— tem suas origens na gestão Lula. Não acha injusto debitar tudo na conta de Dilma? Não há na encrenca um quê de herança maldita?
E Campos: “Acho que ela não tem condições de fazer esse tipo de alegação. Até porque ela comandou essa área. O setor elétrico, o setor de energia, foi comandado desde o primeiro dia do governo do presidente Lula pela ministra Dilma Rousseff. [...] Quando foi para a Casa Civil, ela seguiu comandando, inclusive sendo presidente do Conselho de Administração da Petrobras.”
Bernard Shaw disse certa vez que civilização é o que sobre para ser desenterrado dez mil anos depois. Campos olha para os oito anos de Lula e só consegue enxergar virtudes. Quem vendeu Dilma como supergerente em 2010? Tomado pelo silêncio, Campos acha que Lula não tem nada a ver com isso.
Quem acomodou personagens como José Sarney no miolo das decisões nacionais? Para Campos, Lula não teve nada a ver com isso também. Quem aconselhou Dilma a aposentar a vassoura e devolver ministérios apodrecidos aos prepostos da podridão? Lula tampouco tem participação nisso.
Campos afirmou que os ventos da mudança desarrumaram o cenário de um atrás. Acha que, hoje, até Dilma pode ser soprada para fora do segundo turno. E se vingar o ‘volta Lula’, vai manter a candidatura?, provocou um dos entrevistadores. “Sou candidato para ganhar a eleição”, desconversou Campos. “Não tenho atitude de disputar segundo lugar. Estou disputando primeiro lugar no primeiro turno…”
Ante a reiteração da pergunta, Campos ofereceu mais desconversa: “Nossa disputa é com a presidenta Dilma, não é com o presidente Lula.” Hummmm! “O presidente Lula não é candidato, já afirmou isso publicamente. Ele teve um papel importante na história do Brasil. A disputa agora é com a presidenta Dilma… blá, blá, blá…”
Quer dizer: nesse ponto, Eduardo Campos foi incapaz de soar categórico. Seus lábios se recusaram a dizer algo assim: sou candidato em qualquer situação, mesmo que Lula, por qualquer razão, resolva substituir Dilma na urna eletrônica.
Em voo nacional, o presidenciável do PSB se esforça para aumentar sua estatura estadual. Mas ficou subentendido que, se Lula entrasse no jogo, ele talvez mandasse rebaixar o teto. Admita-se, por razoável, que Lula não descerá à refrega vestido de candidato. Nessa hipótese, o que fará Eduardo Campos no segundo turno se o adversário de Dilma for Aécio?
“Não tenho acordo com nenhuma candidatura”, disse Campos. “Numa eleição de dois turnos, falar no primeiro sobre o segundo é um erro e uma deselegância com os outros candidatos. [...] Tudo o que eu tenho visto é que tem um vento de mudança muito grande. E esse vento de mudança pode produzir qualquer tipo de segundo turno.” É, faz sentido. Tudo pode acontecer. Inclusive nada.

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