A bodega de Seu Antonino Moura era um desses recantos de aconchego, que mais parece a nossa própria casa, aquela que primeiro cultivamos por dentro e só então, passado o frescor da juventude, aprendemos a exteriorizá-la e exprimir nossos tão únicos gostos, as nossas formas. Tinha cheiro, a sonoridade abafada, como se estivesse entrando em um portal, uma penumbra equilibrada pelas diversas prateleiras espalhadas, além da tradicional balança Filizola das bodegas de antigamente. Era lá onde se davam os encontros mais inusitados, logo às 7h da manhã, onde se reuniam personalidades singulares desde beatas, velhos aposentados, fofoqueiros, meninos de recado e sedentos pinguços.
A princípio, uma das imagens mais petrificados que se tem de seu Antonino em vida, é dele servindo uma farta meiota de cachaça por trás do balcão, com um sorriso estampado de orelha a orelha, talvez pelo sucesso como comerciante e de começar o dia com boas vendas, mesmo que às custas do fígado alheio. Isso quando o velho não trancava a cara por causa de algum ‘veaco’ ou menino enxerido. Mesmo assim, aquele homem era um doce! Prova disso era o punhado de confeitos que entregava em mãos para os bons pagadores, a fim de serem distribuídos para as crianças da família.
Outro exemplo de sua prosperidade era que, passada a RN 016, que ficava em frente à bodega, um verde pasto era fartamente regado por um sistema de irrigação, para alimentar suas cabeças de gado, cuidadas por seu funcionário, o que talvez o fizesse um dos poucos homens com um empregado fixo em Nova Esperança, quiçá em toda a várzea. Além, é claro, de sua boa casa, seu relacionamento estável com Dona Enira e sua prole que, vez ou outra, despachava na bodega. A casa tinha até piscina e, ao final do beco que dividia-a com a bodega, se ouvia a algazarra de um papagaio metido a falante, além de um jardim diferente de todos daquele taboleiro.
Em toda a várzea do Assú, nos anos 2000, a bodega de Seu Antonino, homem de aproximadamente um metro e meio, branco, cabelos já grisalhos e encaracolados, dividia espaço com os concorrentes “O camelão”, de Zé Camelo, no Panon I e a bodega de Beno, no Panon II, dois lugares que também se achava de tudo, talvez até remédio para a morte, a depender da criatividade do freguês. Nessa mesma década seu Antonino se encantou desse mundo, mas sua bodega fica na história econômica e cultural da região.
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