segunda-feira, janeiro 6

Despesas indevidas com BPC chegam a R$ 14,5 bi por ano, calcula ex-presidente do INSS


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Os pagamentos indevidos representam cerca de 12% do custo estimado do BPC para 2025. O levantamento foi feito por Leonardo Rolim, ex-presidente do INSS — órgão responsável pela operacionalização dos pagamentos do benefício — e um dos mais conceituados especialistas em Previdência e Orçamento do país.

O BPC é um benefício com o valor equivalente a um salário mínimo (hoje de R$ 1.518) e é pago a pessoas com deficiência e idosos de baixa renda.

O cálculo de Rolim foi feito com base no histórico de concessões entre 2011 e 2024. A conta mostra um aumento que ele considera fora da curva no número de novos beneficiários, sobretudo a partir de 2022, e que não seria justificado pelos números de envelhecimento da população e de pessoas com deficiência — os dois públicos-alvo do programa.

Para chegar a essa conta, Rolim considerou a média móvel de 12 meses de beneficiários do programa. O número de benefícios saltou de 4,71 milhões no período encerrado em junho de 2021 para 6,3 milhões em outubro de 2024 (últimos dados disponíveis). Ele destaca que foi uma elevação de 33,4% entre os dois momentos, muito acima da curva de crescimento do benefício nos anos anteriores.

Rolim calcula que, mantida a curva de crescimento no número de benefícios até fevereiro 2020 (antes da pandemia de Covid-19), seriam cerca de 1,02 milhão de benefícios a menos. Isto significaria uma redução de despesa de R$ 14,5 bilhões em 2024.

— Apesar de não ter ocorrido nenhuma mudança significativa nas regras de acesso ao BPC, verificou-se um elevado aumento no número de requerimentos e no número de benefícios emitidos, especialmente no benefício para pessoas com deficiência. Trata-se de movimento iniciado ainda no governo anterior, em 2022 — disse o especialista.

O governo pretendia atacar o problema no pacote de contenção de despesas anunciado em dezembro e enviado ao Congresso, mas parte das medidas de controle foram “desidratadas” no Legislativo. E também houve veto por parte do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, após acerto costurado com senadores.

A estimativa para este ano é de que os pagamentos do BPC terão um custo de R$ 118,3 bilhões.

Um decreto que regulamentou a lei que criou o auxílio restringe a concessão a pessoas com deficiência grave e moderada. Entretanto, pessoas com deficiência leve e que têm o benefício recusado pelo INSS recorrem à Justiça e, geralmente, são atendidas.

Um terço por via judicial

Os processos judiciais ficam restritos à perícia médica e não envolvem uma avaliação biopsicossocial, uma análise do indivíduo considerando aspectos médicos, psicológicos e o contexto social em que a pessoa está inserida — procedimento usual no INSS.

Uma possibilidade de restrição prevista na proposta original do pacote do Ministério da Fazenda, e que tinha aval da Câmara dos Deputados, incluía na lei a distinção clara dos conceitos “moderado” e “grave” para a concessão do BPC a pessoas com deficiência. Mas esse ponto foi vetado pelo presidente Lula, após acordo para facilitar a aprovação da proposta no Senado.

Segundo Rolim, a introdução dos conceitos na legislação teria potencial para reduzir gastos do governo com decisões judiciais.

De acordo com dados do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), as ordens judiciais representam um terço dos gastos do governo com o BPC. Ou seja, de cada três benefícios, dois são pela via administrativa e um por ordem judicial.

— O que foi proposto pelo governo no projeto de lei atacaria com muita força o aumento indevido e injustificado das despesas do BPC, considerando o perfil da população. O projeto já foi muito desidratado no Congresso. O veto (de Lula) foi uma pena — afirmou Rolim, acrescentando que o BPC pago a pessoas com deficiência leve tem sido um dos principais motivos do aumento das despesas nos últimos anos.

Na avaliação do especialista, outra causa da alta de gastos com o benefício são as irregularidades, sobretudo no critério de renda.

Medidas classificadas como pente-fino, como revisões cadastrais frequentes, uso de biometria e exigência de inscrição no Cadastro Único do MDS na concessão do BPC — que restaram da proposta do governo — são positivas, mas são ações de alcance reduzido, considerando a necessidade atual de reduzir gastos, avalia Rolim.

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O Globo

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